A morte cruel da adolescente Jéssica Hernandes Moreira de 17 anos, assassinada com 13 facadas no final de abril deste ano na cidade de Cerejeiras, pode sofrer uma reviravolta. Isso porque as provas anexadas ao processo e relatos de testemunhas ouvidas nas Audiências de Instrução dos dias 23 e 31 de agosto, contradizem pontos importantes e a cronologia dos fatos narrados pelo réu confesso Diego de Sá Parente.
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O Vilhena Notícias teve acesso a documentos anexados nos autos e relatos de testemunhas ouvidas na Instrução, que apresentam contradição entre a versão dada por Diego Parente em depoimento ao delegado do caso, no dia 25 de abril, data em que ele e o primo Ismael José da Silva – namorado da adolescente, foram presos e apontados como autores do crime.
As contradições mais marcantes são em relação à compra da lona usada para enrolar a vítima e à caminhonete usada para carregar o corpo da jovem. Nos depoimentos prestados por Diego, ele confirmou que atraiu Jéssica até a casa, mas disse que Ismael foi o autor das facadas que vitimaram a moça. Após o crime, Diego contou que ficou no imóvel, enquanto Ismael teria saído e minutos depois retornado com a lona, a gasolina e a caminhonete S-10 usada para levar o corpo até o matagal.
O proprietário da S-10 em depoimento prestado na Audiência de Instrução disse que foi Diego quem pediu a caminhonete emprestada no dia do crime. Assim como o proprietário do estabelecimento onde a lona foi comprada, que confirmou na audiência que Diego esteve na loja para comprar a lona. Outra testemunha do processo também teria confirmado que Diego comprou o combustível. Os depoimentos das testemunhas contradizem a versão do réu Diego Parente dada desde o primeiro momento de sua prisão.
Outros pontos
Jéssica saiu de casa de bicicleta por volta das 08h00 do dia 20 de abril e o corpo dela foi encontrado no dia 24 daquele mês.
Nas primeiras divulgações ainda no dia em que o corpo foi encontrado, foi apresentada a versão com base em relatos de conhecidos da vítima, que Ismael teria tido um comportamento estranho ao ir na casa da família ainda no período da manhã e anunciado o desaparecimento de Jéssica.
Segundo a advogada de Ismael, Shara Eugênio de Souza, seu cliente chegou no local de trabalho por volta das 07h23 do dia 20, conforme mostram imagens de câmeras de monitoramento que registraram o veículo de Ismael.
A reportagem teve acesso ainda as conversas trocadas entre Ismael e a mãe de Jéssica através do aplicativo WhatsApp no dia do crime.
Pouco depois das 09h30 Ismael envia uma mensagem dando bom dia à mãe de Jéssica e pergunta: “Jéssica foi pro hospital?”. Do outro lado a mãe da moça responde: “Não sei ela saiu p ir ver umas coisas dela foi isso que ela falou p mim”. Ismael então envia outra mensagem dizendo que ligaria para Jéssica.
Transcrição das mensagens trocadas.
Ismael – Bom dia
Ismael – Jéssica foi pro hospital?
Mãe – Não sei não sei ela saiu p ir ver umas coisas dela foi isso que ela falou p mim
Ismael – Vou ligar pra ela
Ismael – Vc falou com a Jéssica
Ismael – Ela não mim atende
Mãe – Dá celular desligado
Mãe – Nem chama
Ismael – Eu liguei chamou mais ela não atende
Mãe – Vou tentar de novo
Ismael – Se conseguir fala pra ela mim atender
Mãe – Nem chama
Mãe – Dá celular desligado ou fora de área
Ismael – É agora deu desligado
Ismael – E quando ela saiu daqui ela tava com pouca bateria (A explicação da advogada para a mensagem (“quando ela saiu daqui” é uma citação de Ismael à noite anterior ao dia do crime. O casal esteve no Restaurante El Gaúcho assistindo a uma partida de futebol e a permanência deles no local foi confirmada pelo proprietário do comércio em depoimento à polícia).
Ismael – Não carregou durante a noite?
Mãe – Ela levantou e fico escutando música
Ismael – Nada dela aí?
Mãe – Não
Mãe – Já to preocupada
Ismael – Ué
Ismael – Onde se meteu
Mãe – Não sei
Mãe – Só sei que tou preocupada mesmo
Ismael – Ela ia busca a Manu na creche?
Mãe – Não
Mãe – Pq ficou da rosangela vim conversa antes
A conversa entre eles sofre uma pausa às 10h55 e às 11h10 Ismael volta a enviar mensagens.
Ismael – Falou com ela
Mãe – Não
Mãe – Desligado ainda
Ismael – Já liguei até no hospital
Ismael – E nd
Mãe – Eu não seu nem por onde procura ela
Ismael – Ela tá de bicicleta?
Mãe – Sim
Às 11h14 Ismael diz através de mensagem: “Vou vê se acho ela.
A defesa de Ismael alega que todas as mensagens foram trocadas no momento em que ele estava no Detran, local onde trabalha, e concedeu ao Vilhena Notícias imagens de câmeras de monitoramento que mostram o veículo de Ismael saindo do órgão público às 11h16, dois minutos depois de dizer que iria tentar encontrar a namorada.
De acordo com as investigações da Polícia Civil de Cerejeiras, a moça chegou no imóvel por volta das 08h30 e logo depois foi assassinada. A nossa equipe de reportagem também conseguiu obter imagens de câmeras de monitoramento que mostram a S-10 usada no crime, seguindo em direção ao local onde o corpo foi encontrado às 09h33 do dia 24.
Para a defesa de Ismael não restam dúvidas que Diego agiu sozinho.
Diego teria atrapalhado a vida conjugal de Ismael com a ex esposa
No dia 31, última Audiência de Instrução a justiça ouviu a mãe de Ismael. Segundo informado ao site através da defesa do réu, ela teria dito que Diego teve interferência na separação de Ismael com a ex esposa, com quem tem um filho menor.
Perícia identifica sangue humano na calça de Ismael
A calça e camisa usada por Ismael Silva no dia do crime foram entregues por ele mesmo à polícia. As peças foram enviadas para a capital Porto Velho, onde a perícia identificou na calça a presença de sangue humano, mas não foi possível realizar exame de DNA.
Shara esclareceu que a mancha de sangue foi identificada dentro de um dos bolsos da calça de Ismael. Segundo ela, o próprio réu justificou ainda em depoimento à polícia que o sangue encontrado em sua calça era dele mesmo. “Ismael esclareceu a mancha de sangue. Ele trabalha no setor de vistoria do Detran e mostrou a mão na audiência onde ainda há sequelas de ferimentos causados pelo trabalho que exerce e o próprio Ismael também relatou que sofre com dores de cabeça e quando isso acontece ele tem sangramento pelo nariz”, disse Shara Eugênio.
No processo também consta outro documento no qual o Vilhena Notícias teve acesso. O laudo assinado pelo médico legista Ricardo Braz das Neves Rocha em 25 de abril, dia em que Ismael e Diego foram detidos. O documento é referente ao exame de corpo de delito feito em Diego. O exame mostra a presença de três ferimentos superficiais e em fase de crosta com 0,7 cm de comprimento. Tais ferimentos segundo o laudo, foram identificados no dorso do quarto e quinto dedos da mão direita. A perícia aponta ainda que os ferimentos podem ter sido causados há cinco dias, o que corresponderia ao dia do crime.
Pertences da vítima
Shara Eugênio disse que a bolsa de Jéssica e o cartão de memória do celular dela foram encontrados pela polícia na casa de Diego. “O cartão de memória da Jéssica foi encontrado entre as calças jeans dele [Diego]”, destacou Shara.
No dia 26 de abril homens do Corpo de Bombeiros encontraram a bicicleta da vítima, duas camisetas sujas de sangue e um par de chinelos dentro de um poço no quintal da casa onde Jéssica foi morta. Segundo apurado pela reportagem o réu Diego confirmou em juízo que as duas camisetas pertencem a ele, já o par de chinelos pertencia à vítima. A própria mãe de Jéssica reconheceu o calçado como sendo da filha.
Alegações finais
Os advogados de ambos os acusados apresentaram as alegações finais. A defesa de Ismael Silva acredita que ele será impronunciado – ou seja, o juiz concluirá que não há nenhuma prova contra ele. Se isso acontecer, apenas Diego Parente que confessou o crime deverá ser levado a júri popular. A decisão da justiça pode sair já na próxima semana.
A reportagem não conseguiu manter contato com a defesa de Diego Parente.